sábado, 22 de agosto de 2009

Aborto é crime? Diz o Código Penal que é, ainda que sejam admitidas exceções.

Mas não se pode esquecer que o Código Penal data do ano de 1940, época em que a sociedade estava de tal modo condicionada a preceitos conservadores de origem religiosa, que outra não poderia ter sido a escolha do legislador. Ainda assim, entre a vida da mãe e a do feto, a lei prioriza a vida da mãe, ao admitir a interrupção da gestação que coloca a sobrevivência da genitora em risco. De outro lado, por não ter como deixar de ceder à tendência de prestigiar a paz e o patrimônio familiar, o legislador também admitiu o aborto quando a gravidez resultasse da prática do crime de estupro. Tal exceção visa a permitir que não integre a família uma pessoa que não descenda do seu chefe. É que a lei civil presume que o marido de uma mulher casada é o pai de seu filho. Assim, a gravidez, mesmo decorrente de violência sexual, faz com que o filho do estuprador seja reconhecido como filho do marido da vítima. Essa é a justificativa para a possibilidade legal do chamado aborto sentimental. Apesar do nome com que foi batizado o aborto decorrente de estupro, a preocupação nunca foi com o sentimento da vítima, mais serve para impedir que um bastardo se tornasse herdeiro do patrimônio familiar.

Fora dessas duas hipóteses, tanto a gestante como quem realiza a interrupção voluntária da gravidez são considerados criminosos. Sequer quando modernas técnicas de ultra-sonografia possibilitam identificar que está sendo gestado um ser sem vida, por ausência de cérebro (má formação que recebe o nome de anencefalia), preocupa-se a lei em esclarecer que a antecipação terapêutica da gestão não configura aborto em face da inexistência de vida a ser preservada.

De qualquer forma, e independente do conteúdo punitivo de natureza penal, o fato é que o aborto é praticado em larga escala. As mulheres conciliam fé, moral e ética com a decisão de abortar, não dispondo a criminalização do aborto de caráter repressivo, o que impõe buscar-se a identificação do bem jurídico merecedor de tutela.

Há realidades que não podem ser encobertas. Nem toda gravidez decorre de uma opção livre, basta ver os surpreendentes índices da violência doméstica e da violência sexual. Para quem vive sob o domínio do medo, não há qualquer possibilidade de fazer a sua vontade prevalecer.

Imposições outras limitam a liberdade feminina. Há ainda a infundada crença de que a mulher tem obrigação de cumprir o chamado débito conjugal, o que significa nada mais do que se submeter ao contato sexual, sujeitando-se ao desejo do varão, como se tal fizesse parte dos deveres do casamento. Igualmente a situação de submissão que o modelo patriarcal da família ainda impõe à mulher sequer lhe permite negar-se ao contato sexual. A vedação de origem religiosa ao uso de métodos contraceptivos submete a mulher à prática sexual sem que possa exigir o uso da popular camisinha. Diante de todas essas restrições, imperativo é reconhecer que a gravidez não é uma escolha livre, havendo a necessidade de admitir-se sua interrupção.

Atentando a essa realidade é que a Constituição Federal, ao proclamar como bem maior a dignidade humana e garantir o direito à liberdade, subtraiu o aborto da esfera da antijuridicidade. O § 7º do artigo 226 da Constituição Federal diz: Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal.

No momento em que é admitido o planejamento familiar e assegurada ao casal a liberdade de decidir sobre a eventualidade da prole, está consagrada constitucionalmente a paternidade responsável, não sendo possível excluir qualquer método contraceptivo para manter a família dentro do limite pretendido. Perante a norma constitucional, que autoriza o planejamento familiar, somente se pode concluir que a prática do aborto restou excluída do rol dos ilícitos penais. Mesmo que não se aceite a interrupção da gestação como meio de controlar a natalidade, inquestionável é que gestações involuntárias e indesejadas ocorrem, até porque os métodos preventivos disponíveis não são infalíveis. Via de conseqüência, somente se for respeitado o direito ao aborto, a decisão sobre o planejamento familiar se tornará efetivamente livre, como assegura a Constituição.

O preceito constitucional foi além. Atribuiu ao Estado o dever de assegurar os meios necessários para que a família possa estabelecer livremente sua dimensão. Tal é dito expressamente: compete ao Estado propiciar recursos educativos e científicos para o exercício desse direito. Propiciar recursos educativos significa fornecer informações sobre métodos contraceptivos e propiciar recursos científicos quer dizer disponibilizar meios contraceptivos, entre eles a interrupção da gestação por médico habilitado e pela rede pública de saúde. Ainda que não deva o aborto ser utilizado como método contraceptivo, não se pode afrontar a liberdade da mulher de optar pelo número de filhos que deseja ter. Portanto, além de não poder proibir a interrupção da gravidez, o Estado tem o dever de proporcionar recursos para sua prática, assegurando os meios para sua realização de forma segura.

Imperioso concluir que, em face da falta de recepção pelo novo sistema jurídico, perdeu o aborto seu caráter ilícito em qualquer caso, e não só nas hipóteses em que a lei penal previa a possibilidade de sua prática como excludente da criminalidade. A questão deixou de ser penal. Tornou-se uma grande questão social diante da qual não se pode mais manter passiva a cidadania e ativo o preconceito.

Hoje, crime não é abortar, mas ignorar o aborto como fato social existente, clamando por regramento jurídico atualizado e adequado. Fechar os olhos diante dos fatos já de há muito deixou de ser a solução. Assim, não obstante tenha o legislador em 1940 criminalizado o aborto, o fato é que a sociedade não aceitou o aborto como crime. É socialmente aceita – exceção apenas a algumas minorias religiosas radicais – a idéia de que o aborto não é crime, o que acabou sendo chancelado pela Constituição Cidadã, pois é garantido à mulher o direito à sua própria fertilidade, como forma de assegurar respeito à sua dignidade.



Maria Berenice Dias

Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM

domingo, 9 de agosto de 2009

A Carícia que Destrói a Inocência
Abuso Sexual Contra Crianças, ou melhor dizendo incesto
Psicólogos engordam seus consultórios de clientes abrindo grupos de terapia específicos para tratar seqüelas dessa violência que sempre houve, mas a maioria das pessoas não era capaz de enxergar e muito menos denunciar.
Foi-se o tempo em que educar um filho era uma rotina que se revolvia em casa e na escola da esquina, com a ajuda da tia e da avó. Desde que a mulher saiu de casa para conquistar um lugar no mercado de trabalho, a educação de meninos e meninas foi entregue a babás, creches e irmão um pouco mais velhos. Sempre de soube no passado de casos de abuso sexual. Tudo indica que, com as dificuldades que a vida atual impõem às famílias, o problema aumentou muito, os números são reveladores.
Mas os dados mais graves aparecem quando se analisa o perfil do abusador, muito diferente de um assaltante, que sempre é um estranho à espreita para atacar no momento oportuno, o abusador é, na maioria das vezes, alguém muito próximo, mais do que um conhecido ele é uma pessoa especial, em que a criança confia e de quem ela gosta.
Normalmente é um homem tímido, aparentemente incapaz de maltratar uma mosca, desprovido de agressividade no trato social, sem iniciativa. Isso explica em parte por que, em busca do prazer sexual, esses homens não recorrem à prostituição, uma prostituta ou um garoto de programa é capaz de assustar o agressor de crianças. Trata-se de pessoas consumidas pela idéia de inferioridade, que só conseguem exercer um mínimo de sedução e autoridade diante de meninos e meninas.
Uma pesquisa nacional aponta que 62% dos abusos sexuais acontecem dentro da família, sendo as meninas as principais vítimas - 83% dos casos. No total dos casos, pais e padrastos são os principais agressores, respondendo por 50% das ocorrências. Dessas, em cada quatro casos, três são cometidos pelo próprio pai e uma pelo padrasto. Diante desses números, é fácil compreender por que o abuso de crianças é um assunto difícil de ser encarado por qualquer pessoa. Está, ali, envolvido um dos mais sagrados tabus das civilizações - o incesto, que diferencia o homem dos animais e garante o equilíbrio fundamental a uma pessoa.
Não é difícil imaginar o que acontece com uma criança vítima do abuso sexual. Ela passa pelo trauma de se descobrir traída por uma pessoa que fora capaz de seduzi-la, as crianças são seres inocentes, ingênuas mesmo quando querem parecer maliciosas, e com a afetividade quebrada estas crianças enfrentam um drama que pode acompanhá-los para o resto de suas vidas.
Pais calorosos geram filhos calorosos, enquanto pais desconfiados costumam ter filhos igualmente retraídos. É assim, as pessoas carregam na vida adulta, as lições afetivas que tiveram na infância, por isso, as crianças agredidas e traumatizadas têm mais facilidade para reproduzir esse comportamento mais tarde.
"E o que devemos fazer contra esses agressores, puni-los? Só nos resta confiar na Justiça, e entender que gerar um filho e deixá-los a sorte da vida não basta. Gerar, criar, amar, educar e principalmente respeitar, é fundamental, para que não sejamos "crucificados" pelo pior dos agressores, a sociedade e a consciência".


Esse texto fez-me lembrar de uma matéria que li na revista Veja ainda esse ano...e uma das coisas das quais me chamaram a atençao foi que a maioria das crianças que sofrem abusos sexuais elas na maioria das vezes ao criar um desenho acabam dando destaque aos genitais. Ex: desenham uma pessoa e o destaque principal do desenho e os genitais desta.
Essa questao é muito interessante de analisar, porque elas tentam de alguma maneira chamar a atençao de algo q esta acontecendo com elas. Qualquer sinal deve servir de alerta aos pais.

Nessas férias de inverno por meio da comunidade do orkut "Estudantes de Direito", entrei num grupo de leitura e o livro escolhido para debate foi "Falcão-Meninos do Tráfico - E. Soares, Mv Bill, Celso Athayde"
Pertence ao grupo, 5 membros: Eu, Laila, Mariana, Tailine e o Rodrigo.
Vou expor aqui a opinião de alguns dos membros...

Rodrigo: Eu gostaria de estar aqui, nesse nosso primeiro debate, discutindo com os senhores, sobre as riquezas naturais do Brasil, ou talvez, sobre a educação, sobre o desenvolvimento econômico de nosso país. E não como escreverei sobre algo muito pior que é a realidade das periferias de várias cidades de nosso país. Ao ler o livro Falcão Meninos do Trafico, me surpreendi com o alto desenvolvimento do trafico de drogas em nosso país, a banalização da violência e o aumento da utilização de jovens na participação do trafico, nas favelas, nos morros, nas periferias e afins. Minha surpresa sobre esse assunto não é de hipocrisia, ou até mesmo, ignorância. É uma surpresa de quem nunca vai achar normal, de quem nunca vai tolerar o trafico, a violência, a banalização da criminalidade e principalmente a participação de menores, “crianças” a mercê de traficantes, de bandidos, de marginais em nossa sociedade. Como o próprio autor rotula o livro como um alerta, existem várias outras obras abordando a realidade social em nosso país. E sinceramente, não vejo no rosto de meus amigos, de faculdade, de vizinhança, algum espanto ou surpresa perante essas revelações que esse livro aborda. (não sei quanto aos senhores, membros desse grupo de leitura). Parece-me que falar de crime, de trafico de drogas, de violência, em um país tropical e de clima tropical não pega bem. Mas, faz-se necessário que esse tema seja abordado incansavelmente por nós, estudantes de direito. Ter a esperança em um Brasil melhor, em um estado melhor, em uma cidade melhor, em um bairro melhor é o primeiro passo. Segundo passo, é não nos conformamos com essa realidade cruel, injusta, que nossos jovens presenciam nas periferias de nossa cidade. Precisamos mais do que ninguém acreditar neles, na capacidade de superação de cada jovem, de vencer as adversidades da bandidagem, do tráfico, do caminho do mal.

Terceiro passo é identificarmos e combatermos as raízes da violência, do trafico de drogas, do seqüestro, da corrupção e da bandidagem. Esse submundo que se instala como um hóspede inconveniente em nossa casa. Não podemos de maneira permitir que a cultura da violência, seja introduzida no Brasil. Porque junto à violência, vem o trafico, a intolerância, a injustiça e demais atrocidades.

Precisamos combater a criminalidade de maneira diferente em que ela se faz presente em nossa sociedade, de forma violenta e opressora. E sim, com políticas sociais voltadas ao combate a violência e tudo que a ela se mistura.

É preciso mais do que nunca, políticas educacionais, voltadas ao retorno da população. Investimento na educação e no capital humano em nosso país. Faz-se necessário que o jovem na periferia tenha a vontade, ou seja, poder de escolha, em optar por uma vida honesta, em que ele terá a oportunidade igual aos demais outros jovens de nosso país, ou então, de se submeter ao submundo da criminalidade. Vale ressaltar que hoje em dia o jovem não tem esse poder de escolha, o tráfico, seja talvez, o único caminho de subsistência do Falcão.

Fazendo isso cortaremos o mal pela sua raiz, uma vez combatido, ou seja, combatendo o que alimenta o cérebro e depois comanda as mãos e as pernas das pessoas com um só objetivo: destruir. Possibilitar-se-á ao Brasil um pais mais justo e igualitário entre todos os cidadãos de nosso país.

Concluo minha reflexão sobre esse livro e sobre a realidade social no Brasil, com a importância de uma única palavra: Esperança. É fundamental sermos detentores de esperança em nosso país, em nossas crianças, em nossos políticos, em nossa educação. Mesmo com todas as adversidades que às vezes nós fazem desacreditar por alguns momentos. Precisamos persistir, e só através da educação, e combatendo o mal pela raiz conseguiremos o objetivo principal que é a igualdade social e cultural e a tão almejada por todos: a paz.


Laila: Adorei .. bom o livro foi uma pesquisa de muitos anos do Celso Athayde e do Mv Bill .. ele retrata muito da sociedade e marginalidade a niveis crescentes nas periferias e favelas do pais.

Um ponto que achei muito interessante foi o seguinte : TODOS os entrevistados afirmaram que entraram no trafico para ajudar a familia e todos estavam cientes que o trafico os levaria a morte ou para a cadeia ...ai lembramos quem sustenta o trafico são os riquinhos que roubam, agridem os pais, cometem delitos para usar drogas.... pergunta que fica é a seguinte: QUANTOS RIQUINHOS DARIAM SUAS VIDAS PARA AJUDAR NO SUSTENTO DE SUAS FAMILIAS?

Tailine:Awn, concordo com o que já foi escrito aqui. O livro fala de uma só coisa; A REALIDADE. E esta realidade é formada pela juventude, pela violência, pela polícia, pelos cidadãos, traficantes... por tudo.

Achei interessante que os autores não escrevem só mais um livro descrevendo a realidade e as experiências que passaram.
Além de mostrar todos os lados desta realidade e da violência, em todos os cantos do país, eles apontam as causas da violência e as possíveis soluções para esta.
O livro é muito enriquecedor pq traz, ainda, conteúdos das disciplinas do curso de Direito: Pluralismo Jurídico, finalidade da pena, do Estado e outras questões do Direito Penal (que vou ter só agora, na 2ª fase).

Enfim, achei completo... um bom material de estudo...


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Sobre a minha opinião, eu gostei do livro, ele mostra muito bem a realidade nas favelas e principalmente a realidade em relação as drogas. Consegui ter a visão de que apesar de alguém ser traficante ou usuário de drogas, mesmo assim, não deixam de ser seres humanos, de ter sentimentos, desejos... e ate mesmo sentir felicidade. No meio de tanta pobreza, às vezes, traficar drogas acaba sendo a única saída. E será que essas pessoas acham certo isso? Tanto faz!!Mesmo achando errado, haveria alternativa?


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